Há quase 500 anos atrás era apresentada pela primeira vez a peça de
teatro da autoria de Gil Vicente, “A farsa de Inês Pereira”.
A obra é elaborada a partir do mote: «mais quero asno que me leve, que
cavalo que me derrube».
As personagens principais retratam a vida do quotidiano, e continuam curiosamente
actuais.
Inês Pereira, mulher fútil, adúltera, preguiçosa e interesseira,
casa-se uma segunda vez para alcançar os seus objectivos.
O primeiro marido, o escudeiro, finge e engana, criando
uma imagem de "bom moço"; revela-se depois um tirano mas será morto
na guerra.
Pêro Marques é o marido bobo. Apesar de ser ridicularizado por Inês,
ele casa-se com ela e deixa que ela o maltrate e o traia.
Passados todos estes anos, um qualquer autor da nossa praça poderia
escrever “A farsa de Filipa Vieira”.
Apesar das semelhanças, a comédia replicada ganha contornos de drama.
A nóvel personagem continua adúltera. Deita-se na cama de quem lhe aparece
à frente, e permanece interesseira, como há séculos atrás. Na actualidade casa
até com o seu pior inimigo, para alcançar os seus propósitos.
O escudeiro e, ao mesmo tempo, cavalo de serviço, ainda julga ter o
porte de outros tempos e espera dar-lhe um coice no momento apropriado, mas arrisca-se
a também ser morto na guerra.
Se tal vier a acontecer, para felicidade da pérfida criatura, não
faltará um bobo que a queira carregar, mesmo que seja enganado nesse
relacionamento traiçoeiro.
A obra também se poderia chamar “Farsa de Vitória Pereira”.
Também teria asnos e cavalos em barda.
Traições, jogos de interesse e casamentos.
Bobos e escudeiros.
O problema é que estes são meros figurantes.
Os actores principais estão na outra peça.
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