segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

A farsa


Há quase 500 anos atrás era apresentada pela primeira vez a peça de teatro da autoria de Gil Vicente, “A farsa de Inês Pereira”.
A obra é elaborada a partir do mote: «mais quero asno que me leve, que cavalo que me derrube».

As personagens principais retratam a vida do quotidiano, e continuam curiosamente actuais. 
Inês Pereira, mulher fútil, adúltera, preguiçosa e interesseira, casa-se uma segunda vez para alcançar os seus objectivos.
O primeiro marido, o escudeiro, finge e engana, criando uma imagem de "bom moço"; revela-se depois um tirano mas será morto na guerra.
Pêro Marques é o marido bobo. Apesar de ser ridicularizado por Inês, ele casa-se com ela e deixa que ela o maltrate e o traia.

Passados todos estes anos, um qualquer autor da nossa praça poderia escrever “A farsa de Filipa Vieira”.
Apesar das semelhanças, a comédia replicada ganha contornos de drama.
A nóvel personagem continua adúltera. Deita-se na cama de quem lhe aparece à frente, e permanece interesseira, como há séculos atrás. Na actualidade casa até com o seu pior inimigo, para alcançar os seus propósitos.
O escudeiro e, ao mesmo tempo, cavalo de serviço, ainda julga ter o porte de outros tempos e espera dar-lhe um coice no momento apropriado, mas arrisca-se a também ser morto na guerra.
Se tal vier a acontecer, para felicidade da pérfida criatura, não faltará um bobo que a queira carregar, mesmo que seja enganado nesse relacionamento traiçoeiro.

A obra também se poderia chamar “Farsa de Vitória Pereira”.
Também teria asnos e cavalos em barda.
Traições, jogos de interesse e casamentos.
Bobos e escudeiros.
O problema é que estes são meros figurantes.
Os actores principais estão na outra peça.




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